Entre a crise e a recuperação, PT procura seu rumo

Os que acreditaram que o PT acabaria depois dos eventos de 2016 erraram feio, e o fizeram por não entender a lógica dos partidos de massa. O PT nunca esteve perto de morrer, simplesmente porque tem milhares de simpatizantes, muitos recursos de poder, bom acesso às mídias sociais e uma intelectualidade que continua a sustentar o partido. É uma máquina, que se tornou rica com o passar dos anos e não desidratará de repente.

Sobre déspotas, populistas e demagogos: os arautos dos tempos atuais

Quando Berlusconi emergiu na cena política italiana, o filósofo Norberto Bobbio (1909-2004), um liberal-socialista então com mais de 80 anos, saiu em seu encalço. Escreveu diversos artigos para tentar entender o fenômeno e alertar a opinião pública. Viu Berlusconi como um autêntico ovo da serpente, do qual nasceriam demônios difíceis de serem controlados. Uma seleção desses artigos está agora no volume “Contra os novos despotismos. Escritos sobre o berlusconismo”, recém-publicado no Brasil.

Tudo é possível, mas nem tudo pode acontecer

Ao libertar Dirceu, Bumlai, Eike e Genu, a 2ª Turma enviou uma mensagem à sociedade e aos interessados: ela quer participar do jogo, não somente assisti-lo ou arbitrá-lo. Deseja que o STF se politize e alongue seus braços para abraçar a dinâmica dos conflitos políticos que cortam o País. Não é pouca coisa, mas também não é nenhuma novidade.

Os novos termos do jogo político e social

ENTREVISTA. Quando pensamos em “redes e ruas”, abrimo-nos por inteiro para a sociabilidade contemporânea. Vivemos cada vez mais intensamente em redes sociais e das redes passamos para as ruas, indo do virtual para o presencial. As redes estão fazendo com que mudemos nossas preferências em relação a muitas coisas. Produzem cultura e alteram o modo como nos comunicamos.

Revisitando a obra de Gramsci

ENTREVISTA. O jornalista Leonardo Cazes elaborou uma reportagem para O Globo sobre Gramsci, os 80 anos de sua morte e a recepção de sua obra no Brasil. Como parte desta elaboração, me apresentou algumas questões, que respondi por escrito.

A reportagem foi publicada no dia 26/4/2017 no Caderno Prosa & Verso do jornal.

Paralisação se efetivou, mas não organizou a contestação

Aconteceu como se esperava. Com a paralisação dos transportes públicos, o fechamento das agências bancárias e de parte das lojas e escolas particulares, as cidades ficaram vazias. Protestos e piquetes localizados ajudaram a criar a sensação de excepcionalidade, mas a rotina da vida também mostrou sua força.

A paralisação do dia 28 se efetivou, houve adesão em todos os estados e no DF. Bagunçou o coro dos contentes, perturbou a “ordem” e subverteu a “normalidade”, mostrando que o sistema não controla tudo. Deste ponto de vista, foi um momento catártico, que deveria ser mais saudado que lamentado. Serviu de advertência.

O problema é que não ficou claro seu alvo estratégico. Milhares foram às ruas ou cruzaram os braços sem saber se a questão era defender direitos, protestar contra Temer ou fornecer gás para a candidatura de Lula. Eventualmente, foi tudo isso junto e misturado.

A paralisação deixou aberto o desafio de ser analisada e compreendida.

Ressonância

Não foi propriamente uma “greve geral”, mas os sindicatos e as centrais sindicais mostraram que têm ressonância e conseguem parar ao menos parte da atividade produtiva e sobretudo a mobilidade das pessoas. Ao lado deles, as redes sociais fizeram a convocação repercutir, produzindo aquele efeito cascata que faz com que tudo se dissemine com rapidez e não possa ser contestado. Com isso, a vontade de “fazer algo” e mostrar oposição ganhou fôlego.

O fator que dominou o dia não foi a capacidade de mobilização, mas o descontentamento, a insatisfação social, devidamente turbinada pela confusão e pela simplificação, bem retratadas nos slogans prevalecentes, tipo “fora Temer”, “querem acabar com a aposentadoria” ou “tire as mãos de nossos direitos”.

Partiu-se do suposto de que as reformas tentadas pelo governo Temer agridem direitos sociais, mas ninguém soube demonstrar, de forma cabal, quais direitos estão de fato sendo agredidos. Falou-se que a reforma trabalhista acabará com os sindicatos, mas não se discutiu a força e a representatividade que podem ter entidades mantidas pelo artificialismo do imposto sindical. Falou-se que a prevalência do negociado sobre o legislado prejudica os trabalhadores, mas não se esclareceu que a reforma valoriza os acordos coletivos que não alterem temas como FGTS e 13º salário. Não se destacou também que a reforma “enquadra” a Justiça do Trabalho, impedindo-a de complicar ou anular acertos feitos entre patrões e empregados. E assim por diante.

A ideia que se espalhou como rastilho de pólvora é que a reforma é contra os trabalhadores. E muita gente aceitou isso sem nem sequer analisar o que está sendo discutido e aprovado no Congresso Nacional.

Com a reforma previdenciária ocorre algo ainda pior, mais grave, até porque o tema tende a ser assimilado de modo dramático pela população. A reforma pretendida tem seus defeitos e seus problemas, mas não pode ser interpretada como algo regressista. Ela não liquida direitos, mas regulamenta direitos existentes. Nessa operação, algo se perde, evidentemente, mas o certo é saber se o fundamental estará mantido ou não e se as modificações serão introduzidas para alcançar a todos, e não só aos que já estão incluídos. Talvez ela tire direitos de quem tem e conceda direitos a quem não tem, e aí será o caso de discutir tudo na ponta do lápis.

O direito à aposentadoria continua tão “sagrado” quanto antes, mas agora, em vez de se aposentar aos 55 anos, os trabalhadores farão isso aos 62 ou 65 anos. A idade de aposentadoria não é um direito, mas sim regulação do direito à aposentadoria. É melhor trabalhar menos? Claro que é. Assim como é melhor se aposentar logo de cara com 100% do salário na ativa. A questão é saber se o País tem como sustentar isso, num quadro de modificações demográficas fortes e de reestruturação produtiva. Se não houver uma nova regulamentação, algum risco haverá para os benefícios ou recursos serão drenados de algum outro lugar. Dadas a correlação de forças e a lógica do sistema, é fácil imaginar onde estarão os drenos.

No ponto em que se encontra hoje, ainda em discussão, a reforma manterá muitos privilégios, que beneficiam certas categorias (juízes, policiais, professores). Esse poderia ter sido um dos focos do protesto, mas as centrais sindicais têm o rabo preso e suas corporações estão interessadas justamente na manutenção daquilo que parte da população considera injusto. Para cobrir isso, enfatizam uma injustiça geral que não se configura com clareza.

A reforma previdenciária é problemática. Pelos termos em que está sendo proposta, por quem a propõe e pelo momento. Do lado do governo, carente de força e representatividade, o cálculo é que basta apoio congressual, que pouco importa, no momento, o apoio social. Temer paga o preço de certa sobranceria e da real incapacidade de fazer política com “P” maiúsculo.

Falta de paciência

Por outro lado, na sociedade e na vida associada, não há paciência para discutir o tema. Tudo é contestado de afogadilho, impulsionado pela raiva, pela insatisfação generalizada e pelo oportunismo político. Pegou-se carona no descontentamento para criar um clima de resistência e oposição que de modo algum está organizado. Fabricou-se uma ideia de que “toda a sociedade” está contra Temer e as reformas e que isso significa que ela está automaticamente do lado da oposição, do PT e de Lula. É uma ilusão.

Muita gente parou e insuflou a paralisação sem conhecer as reformas, pura e simplesmente para contestar o governo Temer. Misturou-se tudo num bolo só: falhas e erros das reformas, problematização de direitos sociais, falta de legitimidade governamental, repulsa aos políticos e à vida atual, ressentimentos contra o impeachment de Dilma e solidariedade a Lula.

Teria sido importante que a recusa às propostas do governo viesse acompanhada de um projeto alternativo consistente e articulado, que não se limitasse ao conservadorismo do deixar tudo como está. Faltou ao movimento, porém, uma preocupação técnica mais articulada, que auxiliasse a sociedade a entender o que está em jogo e que opções existem.

Houve luta, com certeza, mas perdeu-se uma oportunidade de ouro para se esclarecer a opinião pública e demarcar o terreno das esquerdas. A polarização que amarra a ação democrática se reproduziu, opondo coxinhas a mortadelas. E a esquerda ainda está tendo de engolir a pecha de “conservadora”.

O País parou, mas na semana que vem, depois do Primeiro de Maio, quando tudo voltar a funcionar com alguma “normalidade”, a vida seguirá e pouco avanço oposicionista haverá.

Talvez não se tenha reforma previdenciária, mas nem por isso o futuro estará mais bem protegido.

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Os 80 anos da morte de Gramsci

No dia 27 de abril de 1937, morreu Antonio Gramsci. O filósofo comunista era então um “homem livre”, já que sua pena de detenção havia terminado em 20 de abril, poucos dias antes de ser derrubado por uma hemorragia cerebral que paralisou a metade esquerda de seu corpo e não pôde ser estancada.

Oitenta anos depois, Gramsci está mais vivo do que nunca.

Depois das delações, o tempo

Pode-se dizer que delação não é prova ou que faz parte do mesmo “golpe” que afastou Dilma da Presidência. Pode-se dizer que os Odebrecht deitaram e rolaram como verdadeiros donos do Brasil e agora estão querendo livrar a cara, descarregando tudo nas costas dos políticos.

Pode-se dizer o que for, mas não há como fazer de conta que nada ocorre de extraordinário, que as delações derivam de pressões indevidas ou que o Brasil se converteu numa “Nação de delatores”.

Com a divulgação das delações dos executivos da Odebrecht, o espanto se combinou com o mal-estar, tamanho foi o buraco que se abriu. Dinheiro sendo distribuído a rodo, a partir de extorsões feitas por pessoas empoleiradas no topo do poder e impulsionadas pela volúpia de empresas que escolheram correr o risco de dilapidar seu patrimônio ético e material.