Diário do Confinamento 2:
Fevereiro, 2020

Aluisio Carvão, OST, c. 1950.
Aluisio Carvão, OST, c. 1950.
Em janeiro, São Paulo anunciou um plano de prevenção e a formação de um comitê estratégico. Era um alerta claro. Só que ninguém prestou atenção.

O Carnaval foi como se esperava. Multidões atrás de blocos, alegria popular, jovens extasiados, desfiles, escolas de samba. Ouvi os Acadêmicos do Baixo Augusta descerem a avenida da Consolação durante toda a tarde de domingo. Não havia sinal de que algo diferente estava prestes a explodir. A quarta de Cinzas foi em 26 de fevereiro. Nesse mesmo dia foi registrada a primeira morte por COVID-19.

O que veio na sequência foi um turbilhão distópico. Um mês depois do Carnaval, em 17 de março, já eram 291 casos, com uma morte. Em 12 de abril, chegaram a 22.169 casos, com 1.223 mortes.

Não foi por falta de indícios e informações. Os sinais estavam dados.

No último dia de dezembro de 2019, o governo chinês comunicou à Organização Mundial da Saúde (OM) o surgimento de uma pneumonia “de origem desconhecida” na região de Wuhan. Pessoas morriam aos montes. Em pouco tempo, o novo coronavírus alcançou a maioria dos países, arrastando consigo o mundo tal qual se conhecia. No Norte da Itália, o estrago foi enorme. Sabia-se que um novo vírus iria circular, carregado por trens, navios e aviões, turbinado por abraços, encontros e aglomerações.

Em 31 de janeiro o Governo de São Paulo e a Prefeitura da Capital anunciaram um plano de prevenção e a formação de um comitê estratégico para ações relacionadas ao coronavírus. Foram destinadas verbas para a compra de kits de segurança e insumos. Era um alerta claro. Só que ninguém prestou muita atenção.

Entrou-se em março com uma sucessão de medidas de contenção. Em São Paulo, principal foco da epidemia, o governo agiu com prontidão. No dia 13, vetou viagens nacionais e internacionais de servidores públicos a trabalho, suspendeu férias de profissionais de saúde, decretou o fechamento gradual das escolas até a suspensão total das aulas. Foram fechados cinemas, museus e teatros. Proibidos eventos públicos que provocassem aglomeração de qualquer número de pessoas. No dia 15, funcionários públicos estaduais com mais de 60 anos passaram a trabalhar de casa, férias e licenças-prêmio foram antecipadas. No dia 18, recomendação para fechamento de shoppings e academias, com apelos para que empresários e lojistas concedessem férias coletivas e evitassem demissões. No dia 19, suspensão de cultos e celebrações religiosas, antecipação das férias dos professores, maximização do emprego de meios virtuais para dispensar o atendimento pessoal na prestação de serviços à população. No dia 20, anúncio do estado de calamidade pública em todas as regiões de São Paulo e suspensão do atendimento presencial das atividades e dos serviços públicos não essenciais. No dia 21, decretação de quarentena.

Deu-se início assim à batalha pelo confinamento, com o qual se tentaria monitorar a circulação do vírus e evitar o colapso do sistema de saúde.

Na contramão, o governo federal negava a gravidade da situação. Somente o Ministério da Saúde funcionava. E, para piorar, o presidente da República convertia-se no porta-voz do negacionismo e do fim do confinamento. Fazia-se pouco caso do efeito devastador do vírus, com o combate a ele sendo transformado em ringue para disputas ensandecidas contra prefeitos municipais e governadores estaduais.

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