Em sua coluna no Correio Brasiliense (28/1), o jornalista Luiz Carlos Azedo foi cirúrgico ao qualificar a atuação do ministro Marcelo Queiroga como uma verdadeira “tragédia sanitária”. O ministro é o principal operador da “estratégia de desconstrução da política de saúde pública” que emana de Jair Bolsonaro e seu governo.
Toda sociedade moderna está estratificada em classes sociais e grupos profissionais, além de outros agregados. Quanto mais complexa, mais se diversifica. Mas as sociedades também se subdividem em camadas que se diferenciam entre si e se justapõem. Vão do céu ao inferno, do topo aos subterrâneos, do ar puro da superfície ao lodo infecto que jaz no subsolo.
Falamos de “elite” para nos referirmos aos indivíduos que possuem recursos específicos – econômicos, políticos, intelectuais, técnicos, científicos, artísticos – com os quais se distinguem e assumem funções de direção, formação, coordenação ou comando. Toda sociedade se beneficia da existência de elites desse tipo, que compõem um ativo estratégico para o progresso social, a sustentabilidade econômica e a democracia. São personagens que iluminam e ensinam, que valorizam a vida e o conhecimento, que cuidam e protegem.
Em outro canto, estão as camadas desprovidas de recursos preciosos, integradas por pessoas sem posses e sem acesso à educação, marginalizados socialmente, que são vítimas de injustiças abjetas e variadas formas de exploração, que precisam de apoios e merecem um lugar ao sol.
Mas, como que vindo das profundas da Terra, perfilam-se também magotes de indivíduos medíocres, sem talentos particulares, desinteressados do convívio comunitário, hostis à igualdade social, predadores e oportunistas, autocentrados em interesses mesquinhos. O número deles, assim como sua maior ou menor capacidade de articulação, variam muito. Quase sempre ficam nas periferias dos sistemas, com infiltrações localizadas e acidentais.
A tragédia de uma sociedade ocorre quando um segmento moralmente deteriorado das “não-elites” assume o controle do Estado, pela via eleitoral ou não. Institui-se então um governo de medíocres, que podem eventualmente ostentar diplomas e currículos mas são pouco ilustrados, tendendo a compensar sua ignorância com espasmos de “autoridade”, agressividade, desdém e superioridade artificial. Costumam desprezar, também, tudo aquilo que vem das mentes mais preparadas, que invejam em silêncio e combatem com sofreguidão.
Os negacionistas, hoje em dia, formam a chusma mais ostensiva desses promotores de tragédias. Eles agem contra vacinas e cuidados sanitários, falam em nome da “liberdade de escolha” e não ocultam seu desprezo pelo cuidado com os outros, pela vida dos demais.
Estão associados a medíocres de variados tipos, que espalham sua incompetência e suas maldades por todos os lados.
A tragédia por eles promovida é abrangente. Não se limita à Saúde Coletiva, mas abarca a Educação, a Cultura, a Ciência, a economia, os diversos setores da administração estatal.
É o que se passa no Brasil. Nunca antes e provavelmente nunca mais no futuro, ter-se-á visto um governo tão ruim, integrado por tantas nulidades políticas, técnicas, intelectuais, administrativas, figuras que se esmeram, dia após dia, a destruir, a dilapidar recursos, a confundir, a descuidar da população. Figuras que, como um subsistema, fazem barulho o tempo todo e põem em circulação uma máquina diabólica preparada para demolir a própria sociedade, a vida humana que nela sobrevive.
Os gregos falavam em “caquistocracia” para se referir ao governo dos piores. Combinavam as palavras kakistos (“maus”) e kratos (“poder”) para qualificar uma equipe governamental integrada pelos mais medíocres, mesquinhos e inescrupulosos indivíduos.
É o que temos no Brasil de hoje. Quanto antes conseguirmos neutralizar os piores que nos governam e deles nos livrarmos, melhor.