O mercado a cada dia é mais onipresente na vida moderna. Não é diferente em São Paulo. Com sua grandeza e seu dinamismo, a cidade é um prato cheio.
Nos últimos tempos, espocaram por ela diversos cafés e padarias gourmet. Estão em toda parte, ajudando a redefinir a paisagem urbana e os hábitos gastronômicos. São símbolos de modernidade, que ganham novos significados e funções.
Um desses templos da panificação abriu as portas recentemente em Higienópolis, bairro chique, de alto poder aquisitivo e bastante adensado. Fincou-se ali, espremido entre edifícios residenciais.
O empreendimento atende pelo nome de “Le Blé – Casa de Pães” e consta que integra uma rede espalhada pela cidade. Apresenta-se como “restaurante francês moderno”. Parece coisa fina.
Por falha de planejamento, incúria ou desleixo, não prestaram a devida atenção ao entorno. Ocuparam um prédio de quatro andares e instalaram os exaustores no teto, a céu aberto.
Não são exaustores comuns, mas duas torres gigantes, duas bocarras vorazes a 5 metros das janelas dos apartamentos vizinhos. Delas sai uma toxina bem conhecida dos paulistanos: um ronco ensurdecedor, que martela o sossego e a paciência dos moradores das redondezas. Quando são ligados, é como se um avião decolasse. Um verdadeiro horror para quem mora por perto.
Nem é preciso dizer que a vizinhança se indignou. O assunto passou a frequentar as reuniões de condomínio e as calçadas. Choveram telefonemas ao Programa Silêncio Urbano (PSIU), da Prefeitura, consultas a arquitetos, a advogados e ao Ministério Público e, evidentemente, muitas tentativas de negociação com os responsáveis.
Passaram-se os dias e nada aconteceu. A revolta começou a gerar ações de boicote ao empreendimento. A indignação cresceu, pessoas passaram a falar em mudar de casa, outras ameaçam chamar a polícia.
O caso, que é corriqueiro em São Paulo, mostra duas coisas importantes.
A primeira é a irresponsabilidade de uma empresa que tem tudo para ser um sucesso mas que não tem ouvidos para a poluição sonora, nem olhos para o meio ambiente. Não demonstra estar interessada em criar uma relação amigável e produtiva com os vizinhos.
A segunda coisa tem a ver com os efeitos potenciais da mobilização dos cidadãos, caso ela se mostre efetiva e resiliente. A faísca que move os moradores é a busca de sossego pessoal e familiar. Mas essa razão aparentemente “egoísta” traz consigo o embrião de uma postura cívica mais ampla: a da conquista da cidade, da valorização da convivência e da urbanidade.
São coisas que os negócios deveriam considerar sempre. Até porque podem perder dinheiro e prestígio.
Enquanto isso, cresce a expectativa de que os órgãos fiscalizadores entrem em ação e os proprietários ajam para resolver o problema. É muita agressão e muito desrespeito para que tudo termine em pizza. Ou em pão francês.
Que estranho esse post. Moto nas proximidades do Le Blé e nem de longe observei esse alvoroço popular contra a casa de pães. Sou sindica em Higienópolis há 9 anos, portanto acabo tendo conhecimento dos aborrecimentos na coletividade. Tão pouco observei o alentado boicote, visto que o salão está permanentemente cheio. Local lindo, comida excelente. Eu recomendo a visita.
Sorte a sua, Meire. Somente depois de muito empenho é que os donos da padaria puseram filtros no sistema de refrigeração e deslocaram a tubulação traseira para o estacionamento de um outro prédio. Não houve “alvoroço popular”, só indignação dos moradores dos prédios vizinhos. Quanto ao salão estar cheio, atribuo à irresponsabilidade das pessoas, que não devem estar preocupadas com a pandemia. Que Deus as ilumine e guie. Eu prefiro não frequentar ambientes que contribuem para deteriorar o meio ambiente.
Em um país digno, à primeira ameaça de subir um trambolho desses nas janelas dos prédios, o poder público interviria e paralisaria a obra… Já aqui, tem-se que lutar e lutar pelo simples direito ao sossego… Muito triste.
Pura verdade. É um escândalo. E nada se faz, nem acontece. E isso na maior e mais importante cidade do País.