O depoimento do general Pazuello, ministro da Saúde, ao Congresso Nacional no dia 2/12 foi de arrepiar. Exibiu ao vivo e a cores uma incompetência em (in)ação. Estamos sem direção, sem política sanitária, nem sequer naquele fulcro estratégico para os tempos de pandemia: o combate ao vírus e o planejamento da vacinação.
Uma tragédia que será sentida por décadas no Brasil. Impossível não ver quanto há de irresponsabilidade na postura do ministro.
Dezembro é um mês de encerramento do ano, de busca de paz e sossego, de confraternização e balanço de perdas e ganhos. Pensa-se em férias, em festas, encontros, presentes, beijos e abraços. Celebra-se a vida, mas nesse ano aziago de 2020, a morte estará em lugar de destaque, junto com a tristeza, a desorientação, o abatimento. Talvez nem presentes sejam trocados, para desespero do comércio. No reveillon, será impossível cantar “muito dinheiro no bolso, saúde prá dar e vender”.
Pazuello não é o único culpado: ele obedece a quem manda, faz parte de um “time”, uma equipe, tem um chefe, ao qual presta uma subserviência rastaquera que não se imaginava existir no Exército brasileiro. Dele, como ministro da Saúde, seria de esperar algo mais próximo da altivez, da coragem, um pouco mais de patriotismo e sensibilidade, alguma capacidade de planejamento. Não é ele um especialista em logística? Em vez disso, ele debocha da doença, das medidas de prevenção, dos cuidados básicos, da própria vacina, que o governo não se preparou para ter. É vergonhoso.
O vírus continua no ataque e de Brasília os sinais emitidos são desalentadores. Refletem uma capitulação típica do negacionismo que por lá impera. Pazuello chegou ao absurdo de dizer que “está provado que o distanciamento social é ineficiente” para atenuar a disseminação do vírus, que aglomerações não oferecem risco algum. Usou como justificativa um raciocínio tosco, errático: “Se o processo eleitoral nas cidades, com todas as aglomerações e eventos, não causa nenhum tipo de aumento da contaminação, então não falem mais em afastamento social”.
Foi além: rabiscou um “plano de vacinação” sem ter qualquer previsão sobre as vacinas que o integrarão, nem quando elas serão aprovadas e chegarão. Garantiu, porém, que somente 1/3 dos brasileiros, na melhor das hipóteses, serão vacinados em 2021, caso haja vacina à disposição. Um terço em um ano! Não se comprometeu, não garantiu nada, não olhou para o futuro. Nada, nenhuma empatia, nenhuma preocupação, só desorientação e uma atitude blasée, com a qual tentou causar impressão e mostrar serviço. De tabela, afundou um pouco mais a imagem das Forças Armadas, que já não mais podem se apresentar à Nação como garantia de ordem, estabilidade e respeito à Constituição.
Se isso não é um crime contra o bem público, contra a saúde e a vida dos brasileiros, então a Justiça não existe mais.
A falta de perspectivas e diretrizes causa tanto dano quanto a pandemia, a alimenta e expande. Provoca mais medo e insegurança. Desnuda a ausência de governo e de gente qualificada nos postos-chave do Estado.
Revela, por fim, a inoperância do Congresso Nacional, que posa de avestruz, cabeça enterrada na terra como se nada mais estivesse a ocorrer.
O certo seria desengavetar um dos 50 pedidos de impeachment que Rodrigo Maia mantem trancados em sua gaveta. Mas Rodrigo está mais preocupado com a presidência da Câmara, com as tratativas internas, não enxerga o País que se desfaz, que morre, que não encontra quem o acolha.
A “gripezinha” bolsonariana, somada às omissões vergonhosas do governo, exige coragem política para que se faça o óbvio. A Constituição está sendo desrespeitada. O Estado não mais garante a vida dos brasileiros, que é cláusula pétrea da carta constitucional. Crime de responsabilidade, cometido em sequência, é motivo evidente para que se ponha na mesa o impedimento do presidente, que levaria consigo esse governo incompetente, com sua ideologia, sua guerra cultural, sua ignorância, sua falta de empatia.