Cenários alternativos e uma articulação ausente

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Cenários sempre apresentam riscos e incertezas. Alguns são mais razoáveis do que outros. Podem ser mais amplos ou menos, assim como contemplar os interesses gerais em maior ou menor medida. Alguns nos levariam mais longe do que outros. Seus efeitos são difíceis de serem prognosticados. 

Quem valoriza a política, faz política, dedica-se a estudá-la, gosta de acompanhá-la ou simplesmente sofre suas consequências, costuma se beneficiar com a apresentação de cenários possíveis, nos quais a organização de algumas variáveis, propostas e circunstâncias pode ajudar a que se decifrem os enigmas do futuro imediato.

Como não caminhamos em uma só direção, nem com um mapa claro nas mãos, e como as situações são confusas e complicadas, estamos sempre a procurar sinais que nos ajudem a seguir em frente, dando-nos direcionamento, algumas pistas, uma razão a mais para a mobilização ou ao menos algum conforto.

Os dados estão lançados no Brasil atual. Crise política, economia que patina, desemprego que se mantém, desarticulação e fragmentação social – tudo parece indicar que estamos indo em direção ao precipício.

Será assim mesmo? Estamos sem opções, ou elas existem e devem ser analisadas?

Consideremos alguns cenários possíveis.

 

Com ou sem Temer

Um. A Câmara e o STF aceitam a denúncia de Janot e aprovam o afastamento de Temer, que é substituído pelo presidente da Câmara dos Deputados. Com o governo de Rodrigo Maia, a base política atual se recompõe e pode, ou arquivar as reformas para cuidar da própria sustentação, ou reajustá-las e diluí-las conforme novos vetos e apoios.

Dois. A Câmara rejeita a denúncia de Janot e não autoriza o STF a julgar o presidente por crime de corrupção. Fortalecido com a decisão, Temer tem caminho livre para governar por mais um ano e meio.

Três. Se tiver sensibilidade, Temer procurará organizar uma “mesa democrática” de conciliação nacional, chamando novas forças e pessoas para auxiliá-lo e emprestar-lhe credibilidade. Neste caso, as reformas ganharão impulso adicional, com base na negociação com os novos parceiros. Serão submetidas a um debate amplo, de forma a incluir a sociedade e os diferentes interesses.

Quatro. Uma variante da adoção desta “mesa democrática” poderá ser a antecipação das eleições de 2018, caso em que se definiriam cronograma, regras e prazos específicos. Outra variante seria a convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva para a reforma política ou, como opção, a fixação da reforma política como agenda emergencial do Congresso Nacional.

Cinco. Se não tiver sensibilidade e optar pela mesmice depois da rejeição da denúncia, Temer terminará por se fechar em copas, reforçar seu time de aliados fiéis, abraçar o baixo clero e o PMDB, governando até o fim de 2018 sem prestar atenção nos reais problemas do país e na opinião pública. Neste caso, o país permanecerá na corda bamba e o processo eleitoral do próximo ano tenderá a se organizar contra ele, num quadro de grande fragmentação.

 

Acordo nacional

Seis. Parlamentares e partidos políticos (PT, PMDB de PSDB) patrocinam um acordo de “salvação nacional”, de caráter fisiológico, que negocia a saída de Temer, desmonta a Lava Jato, absolve os crimes de caixa 2 e adota algumas reformas tidas como prioritárias, tudo sob a coordenação  do presidente da Câmara. Neste caso, o novo governo recebe uma blindagem parlamentar mas pode entrar em rota de colisão com a opinião pública.

Sete. Um acordo deste tipo poderá ser viabilizado, também, por um arco de forças extraparlamentar, incluindo instituições, lideranças da sociedade civil e alguns movimentos sociais. Neste caso, assumiria a feição de um acordo democrático reformador, que poderia limpar o terreno minado pelas polarizações artificiais e traçar um roteiro para a convergência política rumo a um “projeto nacional”.

 

Deposição

Oito. Contagiadas pelos sucessos da Lava Jato, pela crise, pelo desemprego e pela desconfiança em relação aos políticos, bem como por sucessivos protestos do PT e dos movimentos sociais, as ruas sitiam o Palácio do Planalto, depõem o Presidente e exigem a convocação imediata de eleições diretas. Posto contra a parede, o mundo político se desarvora e é forçado a reagir de forma emergencial, dividindo-se entre candidaturas de velhos barões, outsiders e novas caras.

 

As urnas de 2018

Cada um desses cenários apresenta vantagens e desvantagens, implica riscos e incertezas. Beneficia certas forças e prejudica outras. Podem ser combinados entre si. Alguns são mais razoáveis do que outros. O horizonte de cada um deles pode ser mais amplo ou menos, assim como pode contemplar os interesses gerais em maior ou menor medida. Passa-se o mesmo com o potencial de transição: alguns nos levariam mais longe do que outros.

São cenários que trazem consigo desdobramentos e efeitos difíceis de serem prognosticados.  Seus pressupostos estão dados, mas não estão materializados politicamente, e isso porque faltam os agentes decisivos: as massas da população e os políticos com capacidade de liderança e articulação.

Por isso, a maior probabilidade é que fiquemos sem sair do lugar, ou andando de lado, à espera de 2018, quando então, em suas urnas, poderemos enxergar a imagem refletida do nosso infortúnio e de nossas expectativas.

O problema teria como ser equacionado por uma articulação democrática de forças plurais, com desprendimento suficiente para correr o risco da ousadia. Como isso não existe, o ambiente fica turvo e inconclusivo.

Os que poderiam ativar essa articulação ausente comportam-se hoje como pêndulos desgovernados. Ora torcem pela queda de Temer, ora acham melhor que a pinguela vá até 2018. Ora aderem à crítica inflamada e intransigente, ora atuam como pacificadores. Ora contam com a mobilização popular, ora trabalham para mobilizar as elites democráticas. Olham para frente e não conseguem vislumbrar terrenos sólidos para ações criativas e contundentes. De algum modo, desperdiçam-se algumas energias importantes.

A neutralização desta condição pendular é o que fará com que algo de novo desponte no horizonte.

Valendo-se de Romain Rolland, Gramsci falava em “pessimismo da razão, otimismo da vontade”. Não seria interessante começarmos a pensar também em um “otimismo da razão”?

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