A única coisa surpreendente na demissão do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, dada como certíssima até pelos patógenos que nos cercam, foi o discurso do presidente. Não o teor, que nada teve de novo, mas a forma. A linguagem do corpo.
Olhar mortiço, tensão explícita, fala balbuciante entrecortada por silêncios constrangedores, como se fosse um ventríloquo manuseado por cordas invisíveis, o presidente estava bem pouco à vontade. Parecia travado ou, na linguagem da vida louca, chapado. Estava longe de exibir a dose de autoconfiança que mostra nas redes e na porta do Palácio.
Foi a imagem de alguém que ganhou uma batalha, mas perdeu a guerra.
A guerra contra o vírus, que avança implacável. Trocar o piloto com o veículo em pleno movimento é manobra arriscada. Não há como saber se vai dar certo. O novo ministro não tem experiência em gestão pública de políticas na saúde. É um oncologista com experiência de consultor na medicina privada. Se demorar muito para conhecer o Ministério e gerenciar o SUS, com sua complexidade, as coisas podem piorar. A conta irá diretamente para o Palácio do Planalto.
O que se sabe é que o presidente buscou confrontar Mandetta, não aceitou que o ministro protagonizasse a política de gestão da epidemia, do mesmo modo que não aceitou que prefeitos e governadores tomassem conta de seus próprios estados. Houve muita ciumeira e receio de ser ultrapassado pelos fatos, o que agora acabou por acontecer.
O presidente também perdeu a guerra por prestígio, conquistado por Mandetta. A guerra por liderança, perdida bem antes de a desgraça começar. A guerra pela colocação do Brasil num lugar qualificado no mundo. A guerra pela própria imagem. Ao que tudo indica, foi enquadrado pelos assessores militares, o que por certo não representa uma condecoração. Não tem presença ativa no Congresso e recebeu mais de um puxão de orelhas do STF. Agora entrou em litígio explícito com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Passou a alegar que há uma “conspiração” para derrubá-lo.
O presidente hoje não preside, não governa. Vaga por Brasília sem eira nem beira, incensado pelos acólitos do gabinete do ódio. É uma situação esdrúxula, amplificada pelo quadro dramático da pandemia.
Bolsonaro perdeu sobretudo a batalha pelo respeito e pelo coração dos brasileiros. Ficaram com ele os prosélitos, os fanáticos de sempre, com seus bumbos e seus memes, os ingênuos, os conservadores extremados da direita xucra, obscurantista. É pouco. Muito pouco.
Está assim e é triste e doloroso. Agora… e a oposição? E a oposição que não seja o PT, pelamordeDeus!!