O discurso que Jair Bolsonaro fez transmitir para seus apoiadores ontem, domingo 21 de outubro, na Av. Paulista, é uma peça retórica que diz muito sobre o estado a que chegou a política nesse ano de 2018.
Mostrou com clareza um estilo de atuação e uma narrativa de mobilização que vêm à tona alavancando e “racionalizando” os perigos que teremos de enfrentar no próximo ciclo governamental, especialmente se o capitão for eleito no dia 28.
Articulado em uma estrutura memética, com “memes” e frases curtas carregadas de ódio e efeito simbólico, o discurso foi um exemplo de agitação. Feito para insuflar uma massa já mobilizada, também buscou acuar indecisos e adversários. Suas sentenças sanguíneas, extremadas e caricatas, cumpriram a função de levar a multidão reunida na avenida à histeria paroxística.
Nada mais eficiente. Nada mais deplorável. Nada mais preocupante.
“Varrer a petralhada do mapa” e garantir que o Brasil “jamais será comunista” foram frases marteladas durante os dez minutos em que durou a pregação.
É um discurso assustador, desconhecido no Brasil. Sua contundência não lapidada, brutal, esgrimida como uma adaga mortífera, é um convite à violência. É antidemocrático, intolerante, autoritário. Levado a massas excitadas e ressentidas, pode tornar ingovernável o País.
Um Presidente que planeje governar com tal compromisso “patriótico” age como coveiro de si próprio. Ao impulsionar o irracionalismo das multidões, cava sua própria cova.
Isso porque não se mostrará preparado para governar em situações de alta complexidade. Cego pela arrogância e por uma estratégia parcial (com destruição, mas sem construção), Bolsonaro despreza o mundo em que vive, acreditando que poderá controlá-lo com o “instinto animal”, sem qualquer consideração pela pluralidade social, política, moral e cultural típica de uma sociedade moderna como a brasileira.
Ao ameaçar de extermínio os “comunistas da petralhada”, ao estigmatizá-los como antipatrióticos e “vagabundos”, ao prometer deixar “Lula apodrecer na prisão”, o candidato não exibe somente uma perigosa face autoritária, que pela lógica pode implicar a eliminação física dos adversários. Mostra também enorme dificuldade de compreender a sociedade que pretende governar, na qual praticamente não existem comunistas, os “petralhas” não ameaçam a rigor nada nem ninguém, não são uma força inimiga alienígena a ser destruída e nem contam com o apoio da maioria da população. Carece de generosidade e de respeito a direitos e prerrogativas civis. Gera medo, não confiança. A lealdade que obtém é pouco sustentável.
Ao qualificar como “petralhada” o conjunto de cidadãos que não o aplaudem e não o apoiam, Bolsonaro põe no mesmo saco os democratas de esquerda, os liberais democráticos, os social-democratas e os libertários, um vasto campo que não se acomoda em rótulos simplificadores. Isola-se na sua bolha gigantesca, confiando que ela será eterna.
O anticomunismo, travestido ou não da ideia de “combater a esquerda vermelha”, é um fermento que leva a guerras civis e à dilaceração social. Separa e discrimina sem critério. Serve para mobilizar mentes e corações e vencer eleições. Mas é imprestável para que se governe ou se promova uma reconciliação que a cada dia, no Brasil, se faz sempre mais necessária.
Parabéns pelo texto.
Tempos sombrios!
Abraços e tudo de bom
Obrigado, Ozaí. Tempos sombrios, mas seguimos vivos. Abraço
Nem sempre concordante mas sempre estimulante.
Abracao Marco Aurelio!
Valeu, Afrânio! Muito obrigado. Abraço
Prezado Marco, é um prazer receber seus artigos, leio e divulgo entre meus amigos. Agora estou fora do Facebook e do WhatsApp, usando o aplicativo Signal. Dando um tempo para ver como as coisas vão seguir. Sou sua leitora assíduo. Parabéns, precisamos de analistas lúcidos. Especialmente envio seus textos para um grupo de psicanalistas.
Muito obrigado, Lia. Comentários como os teus são um bálsamo! Também já pensei em me afastar do Face e do Whats, por causa do ambiente, ainda muito envenenado. Acho uma medida de prudência da tua parte. Fico muito feliz ao saber que vc divulga os meus textos! Abraço forte,