As importantes adesões à candidatura presidencial de Lula, registradas nas últimas semanas, criaram uma sensação e simultaneamente uma oportunidade de ouro.
A sensação é que a vitória de Lula está selada, seja no primeiro ou no segundo turno. Somente uma hecatombe terá como deslocar o eleitorado, cujas preferências foram indicadas com impressionante estabilidade por todos os institutos de pesquisa. Uma página sombria da história brasileira será virada.
A oportunidade é que estão criadas as condições para que se organize uma ampla frente de sustentação do próximo governo.
Estão criadas as condições, mas elas ainda não foram cimentadas. Os apoios manifestados até agora são, na maioria, do campo liberal e empresarial, do mundo jurídico, cultural e acadêmico. Não expressam forças organizadas. A tradução realista delas é de que reforçaram o viés plebiscitário que esteve presente desde o início do processo eleitoral.
Personalidades são sempre relevantes. A adesão delas a Lula sugere alinhamentos que não podem ser menosprezados. Mas não exprime compromissos políticos incondicionais, nem garante apoios futuros. Adesões e manifestações de apoio são atos simbólicos, de voto e torcida, digamos assim. Importantíssimos, mas não decisivos quando se pensa num governo em ação.
Estamos a dois dias do desfecho da disputa presidencial. Nesse minúsculo intervalo de tempo, não há porque esperar que sejam encetadas articulações políticas substantivas. Nem que seja apresentado o que de fato se tentará fazer num futuro governo Lula.
O PT não buscou isso, em boa medida porque não precisou, tamanha foi a distância que Lula abriu dos demais candidatos desde o início. Não houve acomodação, mas desinteresse, talvez um erro de cálculo.
Agora, já deve ter caído a ficha de que não haverá um governo sério a partir de 2023 somente com os apoios recebidos por Lula. Uma coligação precisará ser feita e seria ótimo se isso começasse a ser ensaiado desde logo. O preço a ser pago caso não se avance nessa direção é de o próximo governo ser fisgado pelo Centrão, afastando-se do campo democrático mais restrito que, por certo, se fará representar no Congresso Nacional.
O eleitor, por isso, deveria prestar maior atenção às disputas parlamentares. Um Congresso mais progressista, menos fisiológico, de maior qualificação, terá enorme importância a partir de 2023. Seja para dar sustentação ao Executivo, seja para compor uma oposição democrática combativa e leal.
Está certo o assessor econômico do PT, Guilherme Mello, quando diz que “é preciso conhecer a formação do Congresso para dialogar com os parlamentares sobre o novo arcabouço fiscal” e os demais planos governamentais.
O Congresso Nacional é, de fato, a instituição onde acordos e negociações podem frutificar. Isso, no entanto, depende de três fatores: (a) que os partidos políticos se façam presentes e cumpram suas próprias diretrizes programáticas; (b) que o Executivo se apresente com clareza, sem subterfúgios e sem a preocupação de formar maioria a qualquer custo; e (c) que a sociedade civil e a opinião pública sejam devidamente ouvidas e conclamadas a participar.
Por tudo isso, assim que se fecharem as urnas, será fundamental que se abra uma ampla mesa de diálogo da qual participem todas as lideranças e forças políticas organizadas que se disponham a sustentar um governo que tenha como estrela-guia a defesa da democracia, das liberdades civis, dos direitos, da ética pública e da seriedade administrativa.
Somente o diálogo democrático pode nos levar para frente.
Se isso acontecerá ou não na prática, não se sabe. O que se deve considerar como possibilidade concreta é que, se nada for feito para reorganizar o que foi desorganizado, debater o que realmente importa e reunir as melhores energias da sociedade – chamando isso de “governo de coalizão” ou de qualquer outro nome –, correremos o risco de não sair do lugar.
Marco,seu texto ajuda a trazer pessoas civilizadas e democráticas para o cenário da reconstrução do Projeto Socio-Político de um Brasil respeitado e justo. Obrigada pela reflexão e pelo sinal de alerta.
Obrigado, Regina. Vindo de você, o comentário me anima a seguir tentando. Abraço
seu texto é uma janela de futuro importante. De fato Lula tem todas as chances bo primeiro turno, mas também se for necessário o segundo turno. E a ampliação da frente para governar está em construção, é muito bom ver a inteligência brasileira pensando nesse caminho. Adorei ler o texto.
Obrigado, Zébeto! Grande abraço