
Seguir em frente
Dada a temperatura elevada que acompanha a evolução da crise política, com suas contradições, algumas providências deveriam ser tomadas para que possamos seguir em frente, ou ao menos tentar.
Descubra esse livro inteiramente dedicado a examinar os temas e problemas atuais, da ascensão da extrema direita ao populismo, da vida digital ao identitarismo
Numa dinâmica e instigante conversa, publicada no canal de Risério no Youtube, o antropólogo e o sociólogo discutem as principais questões da agenda política e cultural contemporânea.

Dada a temperatura elevada que acompanha a evolução da crise política, com suas contradições, algumas providências deveriam ser tomadas para que possamos seguir em frente, ou ao menos tentar.

A crise está servindo para que se decida não somente a sorte do governo Temer, mas algo muito mais sério: a sorte da redemocratização, que depois de 30 anos virou democratização mas não se estabilizou nem se adensou, e hoje se mostra necessitada de recomposição.

Nem tudo está entregue a operadores ilícitos, a conservadores reacionários e a mascarados treinados para desmobilizar. Porque áreas saudáveis também se reproduzem, pulsam e resistem. Elas estão, porém, reprimidas e sufocadas pelo bate-cabeças generalizado, pelo silêncio das lideranças, pelos frêmitos da precipitação que excita, pela falta de diálogo construtivo entre as partes.
Macron foge das rotulações ideológicas, mas suas propostas econômicas são liberais. Vangloria-se de incorporar “o melhor da esquerda, o melhor da direita e o melhor do centro”. Costuma se apresentar como “social-liberal”, dizendo-se disposto a reformar o sistema de proteção social francês sem alterar sua generosidade. Seu programa e seu posicionamento, porém, são confusos.

As coisas não podem ficar como estão. Chegou-se a um ponto em que ou alguém põe o guizo no gato ou o castelo cairá. Ou o que sobrou do castelo. As ruas e a sociedade civil, o que houver de energia e discernimento nos partidos e os movimentos sociais precisam encontrar um ponto de unidade e convergência, a partir do qual interpelar os eleitores.

Minha experiência no “Opinião” foi bem adequada para um recém-formado que precisava se afirmar para si próprio. Aquele foi um período de “fúria metodológica”: julgava tudo (livros, autores, editores, leitores) por um metro altamente discutível, o da maior ou menor fidelidade ao método de Marx. Não havia livro que me satisfizesse.

É preciso descartar a ideia de que tudo o que rola na Lava Jato é uma armação da “direita”, fruto do egoísmo das elites, da invenção da mídia, da perseguição política e da luta de classes contra Lula. A esquerda também pode roubar e corromper, composta que é de humanos, não de santos ou deuses.

Temer é de certo modo uma figura paradoxal. Um presidente improvável e estranho ao modo como os brasileiros entendem a Presidência e seu ocupante. Mas, curiosamente, parece ter imprimido um estilo mais frio e opaco ao centro do poder político, o que não é pouco neste País estraçalhado por crises, pela desigualdade e pela polarização.

A montanha parece ter parido um rato. Só que não. O confronto serviu para que a opinião pública possa por a mão na consciência pela enésima vez.

Os que acreditaram que o PT acabaria depois dos eventos de 2016 erraram feio, e o fizeram por não entender a lógica dos partidos de massa. O PT nunca esteve perto de morrer, simplesmente porque tem milhares de simpatizantes, muitos recursos de poder, bom acesso às mídias sociais e uma intelectualidade que continua a sustentar o partido. É uma máquina, que se tornou rica com o passar dos anos e não desidratará de repente.

Quando Berlusconi emergiu na cena política italiana, o filósofo Norberto Bobbio (1909-2004), um liberal-socialista então com mais de 80 anos, saiu em seu encalço. Escreveu diversos artigos para tentar entender o fenômeno e alertar a opinião pública. Viu Berlusconi como um autêntico ovo da serpente, do qual nasceriam demônios difíceis de serem controlados. Uma seleção desses artigos está agora no volume “Contra os novos despotismos. Escritos sobre o berlusconismo”, recém-publicado no Brasil.

Ao libertar Dirceu, Bumlai, Eike e Genu, a 2ª Turma enviou uma mensagem à sociedade e aos interessados: ela quer participar do jogo, não somente assisti-lo ou arbitrá-lo. Deseja que o STF se politize e alongue seus braços para abraçar a dinâmica dos conflitos políticos que cortam o País. Não é pouca coisa, mas também não é nenhuma novidade.